sábado, 17 de maio de 2008

Lars and the Real Girl


Numa das cenas de Lars and the Real Girl os “anciões” da pequena aldeia reúnem-se para tomar uma decisão: devem ou não aceitar a estranha ilusão de um dos seus? Várias vozes se levantam contra, até uma das velhotas trazer todos à razão, lembrando a cada um as suas manias e loucuras, os seus momentos mais estranhos e peculiares. Esta sublime cena espelha as decisões pessoais de cada espectador em alinhar ou não nesta fantasia.

A premissa não é de fácil digestão, podendo afastar muito boa gente que vê este filme como mais uma maluqueira perversa, da piada fácil e do mau gosto: Lars, um solitário com dificuldade nas relações interpessoais, compra uma boneca numa sexshop virtual e faz dela o seu novo amor.
Quem viu o trailer percebeu que morava aqui muito mais que um vulgar caminho; para ele Bianca é real, com um passado e um presente, com gostos e sorrisos, com virtudes e defeitos, com a carne que o faz dialogar e apresentá-la ao resto do mundo. Quem viu o filme sabe que está aqui o caminho certo; sem saberem bem o que fazer, o seu irmão e a sua cunhada, com a ajuda de uma médica, decidem entrar na ilusão e fingir que nada se passa, passando a palavra e levando uma pequena comunidade a aceitar Bianca, a ajudar Lars. O que nos oferece um conjunto de situações estranhamente divertidas, assentes no evoluir de uma mente fechada que cria um amor ficticío com um objectivo, ela está na cidade por alguma razão diz a médica. Ao divertimento junta-se uma serena balada sobre o ser humano, as amizades e os afectos, tudo com uma suavidade caseira, embalando qualquer coração. A música é a luva na mão certa, os secundários são bastante bons, com especial atenção para Paul Schneider (já tinha gostado muito de o ver em Elisabethtown), e Gosling é (mais uma vez) soberbo, fechando a peculiar persongem no seu cabelo lambido e olhar nervoso, deixando em aberto as questões duma cabeça complexa. E é isso que nos faz sentir família, a oportunidade que a história nos dá de sermos nós os escritores finais, de entendermos Lars à nossa maneira.

Quando cai o negro dos créditos ficamos com a sensação que queríamos mais, quase como se nos tivessem tirado à força um quente cobertor numa gélida tarde de Janeiro. Mas as paixões são assim, e assim como Bianca chegou, assim nos deixou...

(+) A história podia ter descarrilado para tantos lugares comuns mas consegue de forma primorosa levar a carruagem à estação do triunfo.
(-) É um pequenino grande filme que poucos irão ver.

1 comentário:

Cataclismo Cerebral disse...

Grande filme, que infelizmente está a passar ao lado de muito boa gente.